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Antonina, Litoral do Paraná, Palestine
Petroleiro aposentado e petista no exílio, usuário dos óculos de pangloss, da gloriosa pomada belladona, da emulsão scott e das pílulas do doutor ross, considero o suflê de chuchu apenas vã tentativa de assar o ar e, erguido em retumbante sucesso físico, descobri que uma batata distraída não passa de um tubérculo desatento. Entre sinos bimbalhantes, pássaros pipilantes, vereadores esotéricos, profetas do passado e áulicos feitos na china, persigo o consenso alegórico e meus dias escorrem em relativo sossego. Comendo minhas goiabinhas regulamentares, busco a tranqüilidade siamesa e quero ser presidente por um dia para assim entender as aflições das camadas menos favorecidas pelas propinas democráticas.

sexta-feira, 25 de novembro de 2016

Sobre a primavera secundarista

Copiei do Cassio Lombardo

SOBRE A PRIMAVERA SECUNDARISTA

Demorei um pouco para escrever sobre este assunto, mas enfim, vamos lá.
As ocupações estudantis realizadas em escolas de todo o país foram marcadas por inúmeras e divergentes opiniões.
Sim. Ocupações e não invasões, afinal aquilo que nos pertence, não invadimos, mas sim ocupamos.
Primeiramente não tenciono em momento algum ser dono da verdade, mas como vivemos em um país em que a lei ainda nos assegura o direito de pensar diferente (pelo menos por enquanto), refleti muito sobre este assunto antes de escrever e ressalto que respeito o direito de quem pensa de outra maneira, pois afinal cada qual tem um perfil em rede social para registrar no SEU perfil suas opiniões.
Antes de tudo, há muitos anos as diretrizes educacionais vêm enfatizando a necessidade de a educação ter como objetivo a formação de alunos críticos, pensantes, capazes de se utilizar disso como práxis social e, através do exercício da cidadania, modificar a realidade que vivemos. Lemos e relemos isso em reuniões, encontros pedagógicos, formações e tantos outros momentos. Incentivamos, enquanto educadores, nossos alunos a isso, e de repente, quando estudantes resolvem agir assim, resolvemos rotulá-los como vândalos e marginais?
Penso eu que um estudante que participou de uma ocupação tinha o consentimento dos responsáveis para isso e se não tinha, a discussão se torna muito maior, lembrando sempre que a primeira responsabilidade sobre esta população cabe à família.
Mas falando em família, muitas pessoas vão dizer que o problema é que a família hoje está desestruturada, que o problema é a falta da religião, que o problema é o Estatuto da Criança e do Adolescente, o Conselho Tutelar e outros. Pois bem, vamos por partes.
O que é uma família estruturada nos dias de hoje? Ter pai, mãe, almoçar juntos no domingo e ter uma religião? Conheço muitas famílias neste “modelo” que são permeadas de traições, agressões de toda espécie e diversas contradições. Conheço também muitas mães, tias e avós que bravamente enfrentam a discriminação da sociedade e criam uma criança sozinha, proporcionando-lhe um lar muito mais saudável. Portanto, penso que está na hora de revermos nosso conceito de “família estruturada”.
Falta de religião? Que bom seria se a religião resolvesse problemas de caráter. Não teríamos líderes religiosos envolvidos em pedofilia, lavagem de dinheiro, enriquecimento ilícito e outros. Não quero com isso, generalizar que todo líder religioso seja assim, mas existem muitos. 
Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e órgãos de garantia de direitos de crianças e adolescentes. Penso que já está na hora de desmistificar algumas opiniões sobre o ECA, pois a criação desta lei veio justamente para garantir as mínimas condições para crianças e adolescentes que vivem em situação de vulnerabilidade social e pessoal. Mas alguns vão dizer assim: mas no meu tempo com.... anos eu trabalhava e hoje uma criança não pode trabalhar, por isso vira marginal. Vale lembrar que a legislação sobre as crianças e adolescentes estabelece isso, em detrimento daqueles que se aproveitariam do fato de uma criança poder trabalhar para explorá-la no trabalho infantil, prejudicando sua formação escolar, pagando-lhes salários ínfimos e sem nenhuma garantia trabalhista. Outros irão dizer que os Conselhos Tutelares “estragaram” as crianças de hoje, pois não se pode mais bater. Em relação a isso, penso que existem diversas formas de se educar sem se utilizar da violência e conheço por sinal, muitas pessoas que educaram seus filhos sem sequer lhes desferir um tapa na vida, obtendo respeito de outras formas. Indo mais além, acho de um profundo desconhecimento afirmar que Conselhos Tutelares agem assim e deixo a dica: faça uma visita ao Conselho Tutelar, converse com os Conselheiros e sua opinião mudará.
Mas daí parece contraditório afirmar que a criança e adolescente precisam ter garantida sua escolarização e ao mesmo tempo defender ocupações. Não, não parece. Afinal é dever do Estado garantir o mínimo de 800 horas anuais de estudo, distribuídas em 200 dias letivos e para isso é ofertada a reposição de aulas. Ahhhh mas prejudica o vestibular dos estudantes que estão concluindo o Ensino Médio. Não, também não prejudica, uma vez que inúmeras universidades também foram ocupadas e terão atraso nas suas atividades, sendo negociável esta questão, tal qual já ocorreu em outras situações.
Além do mais, o indivíduo estuda no mínimo 12 anos para concluir o Ensino Fundamental e Médio. E convenhamos, se em 12 anos ele não obteve uma diversidade de conhecimentos, não seriam em algumas semanas de ocupação que os obteria. E de quem é a culpa? Do sistema escolar que é falho? Do professor que não é preparado? Da estrutura que é precária? Do desinteresse do aluno? Penso que não há uma resposta única para esta questão. Mas vamos analisar: se o sistema é falho ou a estrutura é precária, isto foi justamente uma das motivações da ocupação, afinal não se melhora um sistema educacional, extinguindo disciplinas e congelando investimentos por 20 anos. 
E os professores preparados e atualizados? Em um momento onde se propõe inúmeros retrocessos na educação, aumentando número de alunos por sala, fechando turmas, extinguindo direitos adquiridos historicamente pela classe do magistério, descumprindo acordos feitos entre o governo e sindicatos, sucateando escolas, reduzindo investimentos na educação, dificultando possibilidades do professor se especializar, não ofertando o atendimento médico adequado aos profissionais da educação, como podemos falar em professores motivados e atualizados?
Há ainda a questão salário. Muitas pessoas acessam aos portais da transparência com o objetivo de verificar salários de professores, alem de achar que possuem muito tempo de férias. Pois bem, se você acha que o salário é bom e que as férias são longas, lembre-se que você pode prestar um concurso também e ingressar nessa carreira. Mas lembre-se também que você precisará trabalhar, muitas vezes, de manhã, tarde e noite, em salas de aula repleta de desafios, desde o número excessivo de alunos, tirando dinheiro do seu bolso para pagar fotocópias, utilizando sua internet e seu tempo de descanso em casa, possuir uma bexiga capaz de acumular litros de urina, ter uma audição capaz de suportar muitos decibéis, ficar 50 minutos numa sala lotada em altíssimas temperaturas e ainda lidar com aquele aluno cujo responsável dificilmente comparece na escola quando chamado ou quando aparece vai lhe dizer assim: eu não posso mais com a vida do meu filho. Se ainda assim você achar que o salário e muito alto, venha conosco trabalhar na educação, isto é, se você agüentar, pois conheço muita gente que não agüentou o tranco rsrs.
Outros irão dizer: se é tão ruim, é simples, troque de profissão. Esta resposta é a mesma que eu poderia dirigir a vocês, responsáveis que dizem não dar conta de educar seus filhos. Troque de filho. É a mesma resposta que eu poderia dar a você policial que reclama das péssimas condições de trabalho e segurança na sua profissão. A você funcionário de uma empresa privada que também questiona seu excesso de atribuições, mas também receia trocar o certo pelo duvidoso. A você que estudou anos para trabalhar naquilo que gostaria e nem por isso deve deixar de lutar por melhorias. 
Vale lembrar ainda que uma coisa não anula outra, ou seja, você pode e deve fazer o melhor na sua profissão, mas nunca deve deixar de lutar por melhorias ou por aquilo que lhe é de direito.
E o estudante? Aquele estudante que pede para o professor facilitar sua vida, que agradece quando o professor falta, que admira o professor que é “bonzinho e amigo”, sente-se apto para questionar algo? Não seria melhor exigir do professor aquilo que lhe é direito? Não estou aqui querendo dizer que a sala de aula não deva ser um ambiente saudável e harmonioso, mas as funções devem ser exercidas corretamente, tanto do aluno quanto do professor, pois é perfeitamente possível estabelecer laços afetivos com alunos sem deixar de exercer sua profissão, ensinando, avaliando, cumprindo e respeitando as regras estabelecidas. 
E o desinteresse do aluno? Aqui deixo claro que independente da posição do estudante (a favor ou contra as ocupações), cabe a ele uma nova postura diante desse novo cenário. De nada adiantaria ter participado de uma ocupação se você não valoriza o estudo assim como de nada adianta ter brigado pelo direito de estudar se o estudante chega atrasado diariamente, abaixa a cabeça e dorme em sala de aula, se tenta descumprir a lei utilizando celular dentro da escola, se ao invés de prestar atenção na aula fica realizando atividades de outra disciplina e tantas outras situações.
E os ex alunos? Aqueles que hoje criticam as ocupações reivindicam direitos de seus filhos que estão na escola, mas que sabemos bem a conduta que tiveram quando foram alunos? Que mudança de pensamento não? Hoje você critica uma ocupação, mas quando esteve lá na escola, qual era seu comportamento e sua valorização pela educação? Sem comentários......
Sobre os estudantes serem massa de manobra: acho interessante que quando se discute redução da maioridade penal, por exemplo, a grande maioria alega que se um adolescente pode votar, pode responder por seus atos. Mas quando se trata de ocupação, daí os alunos não são mais responsáveis pelos seus atos e sim manobrados por grupos esquerdistas.
Ahh mas existiam grupos de esquerda por trás das ocupações. E se existissem? As ideologias não são diferentes de esquerda e direita? Ainda bem que os MBLs, bolsomimions e outros grupelhos de direita por ai nunca estiveram por trás de manifestações pró-impeachment, nem insuflando pessoas a agir de forma violenta contra as ocupações né? Hilário. 
Mas ainda vem q questão da reformulação do Ensino Médio. Segundo alguns, esta proposta já existia antes do Governo Temer. Existia sim, uma proposta de reformulação do Ensino Médio onde durante meses os professores foram capacitados através de uma formação chamada Pacto Nacional pelo Fortalecimento do Ensino Médio. No entanto, este pacto propunha mudanças na organização do Ensino Médio através de áreas de conhecimento, garantindo que não haveria a extinção de nenhuma disciplina. Posso afirmar isso porque fui um dos profissionais que me capacitei como orientador de estudos desta proposta e tenho em minha posse todo o material da época que é totalmente diferente do que se propõe hoje.
E sobre PECs e MPs? Muitos daqueles que alegaram que estudantes sequer sabiam o que isso significava, também não sabiam ou ainda não sabem. Com a diferença de que muitos foram em busca do que isso significava enquanto alguns se limitaram a permanecer com o discurso vago de que o jovem é manipulado.
Falando em manipulação. O que dizer sobre a influência midiática de gigantes da comunicação? E sobre a doutrinação religiosa que leva muitas pessoas a serem intolerantes com o próximo? Sobre a doutrinação fascista que perpetua discursos de ódio contra minorias? Aí não tem problema né?
Ainda sobre as ocupações, muitas pessoas falaram sobre depredações e vandalismo em escolas e até mesmo na morte de um jovem que não era membro da ocupação. Pois então, vamos refletir. Se essas ocupações tivessem recebido apoio de profissionais, responsáveis por alunos, membros da comunidade talvez as ações fossem diferentes. Quantas pessoas de fato foram visitar uma ocupação para saber realmente o que estava acontecendo lá? E as ocupações em que estudantes limparam escolas e fizeram melhorias na estrutura? E as ocupações onde ocorreram rodas pedagógicas para debater assuntos, palestras, grupos de estudo? Essas não são mencionadas né? É mais fácil enfatizar somente o que convém aos grupos dominantes. E aquele responsável que acompanhou o estudante na ocupação e até pernoitou junto na escola? Provavelmente tem outra história para contar sobre o aprendizado que lá obteve.
A grande verdade é que se fala tanto na juventude mudar o mundo, mas na prática o que se quer são jovens que apenas se curvem ao status quo.
Ainda assim, haverá quem diga que pode se protestar de outra forma, sem ocupar uma escola. Concordo com isso. Realmente há inúmeras formas de protesto. No entanto, se um grupo de estudantes faz uma passeata na rua, a grande maioria das pessoas ignora, não participa junto ou reclama que está atrapalhando o transito. 
Entretanto, ocupar uma escola, mexe com a sociedade. Tira da zona de conforto aquele responsável que quer o filho na escola, embora sequer compareça à mesma para acompanhar a vida escolar da criança, adolescente ou jovem.
Quando vejo outros órgãos paralisados por conta de greves ou manifestações, não vejo a mesma indignação das pessoas. E isso não significa para a grande maioria que a escola é mais importante e por isso se revoltam. Não desmereço nenhuma categoria por reivindicar seus direitos, porém não vejo indignação quando outras instituições públicas ou até mesmo privadas paralisam suas atividades e isso também interfere no cotidiano das pessoas. Não vejo pessoas gritando palavras ofensivas nas portas de correios, bancos e outros.
Qualquer pessoa que se dedique um tempo a estudar a trajetória da humanidade vai ver que nenhuma conquista social foi obtida com pessoas sentadas no sofá da sua casa. Todas foram conseguidas a duras penas, muitas vezes causando empecilhos naquele momento para que se pudesse lograr êxito no futuro. Basta estudar um pouco da História.
E enfim. Sobre o tal direito de estudar, que foi cerceado por conta das ocupações.
Acho notável que há um ano as mesmas pessoas que incentivaram o fechamento das estradas do país, que incentivaram a ocupação forçada de Brasília, hoje chamem de marginais os estudantes da primavera secundarista. 
Se for pra falar sobre direitos vamos lá:
O funcionário de uma repartição que ao invés de atender ao público demonstra má vontade, se esconde numa sala ou na cozinha, não estaria também tirando o direito do cidadão, uma vez que é remunerado para isso?
O funcionário público que utiliza computadores, materiais, veículos públicos para uso pessoal, não estaria tirando o direito de diversas pessoas que necessitam e têm direito a estes serviços?
Os funcionários de serviços básicos de saúde, segurança e outros que dão aquela “escapadinha” do seu plantão, não estariam tirando também o direito daqueles que necessitam de algo emergencial?
O advogado que forja provas para salvar o cliente, não estaria também tirando o direito à verdade dos fatos?
O servidor que leva aquela cesta básica para sua casa, não estaria também tirando o direito daqueles que necessitam do alimento?
O empresário que sonega impostos, não estaria também tirando o direito da maioria da população usufruir das benfeitorias realizadas com a arrecadação?
O empresário que fornece notas frias e devolve “troco” ao poder público, não estaria também tirando o direito da população ser beneficiada de diversas maneiras?
O poder público que faz caixa dois, não estaria também tirando direitos da população?
O agente do legislativo que aceita negociatas para se beneficiar, não estaria tirando o direito da população, uma vez que deve ser independente e fiscalizar o Poder Executivo?
O patrão que não registra o funcionário na CTPS não estaria tirando o direito do trabalhador no que tange ao seu futuro?
O profissional da educação que discrimina minorias (LGBTs, Negros, Indígenas e outros) não estaria tirando também o direito destas pessoas se escolarizarem?
O criminoso não estaria também tirando direitos dos outros. Certamente que sim. Entretanto, aqueles que pregam que devemos acreditar na justiça e na segurança, muitas vezes são os primeiros a querer fazer justiça com as próprias mãos ou abusar de sua posição.
O funcionário público que desvia uma cesta básica para sua casa, não estaria tirando também o direito daquele que necessita deste alimento?
O profissional que assina laudos técnicos falsos não estaria também tirando direitos de pessoas?
Os conservadores que pregam a xenofobia, o racismo, o fundamentalismo, não estariam também contradizendo leis internacionais e princípios religiosos, retirando direitos de uma significativa parcela da população?
Estes são apenas alguns dos tantos questionamentos que poderia fazer, mas acho que por hoje basta.
Sempre haverá quem ache que questionamentos desta natureza são “mimimi” e papo da “turma dos direitos humanos” que defendem políticas afirmativas e igualdade de direitos.
Quanto a mim, embora não seja uma pessoa religiosa, tenho certeza que sigo as regras do respeito ao próximo, muito mais que diversas pessoas por aí com joelhos calejados ou com diplomas de variadas espécies.
E quanto à educação, lembre apenas que se você chegou aonde chegou, você precisou de um professor na sua vida, enquanto muitos dariam tudo para ter a oportunidade de se escolarizar e não conseguiram.
Respeitadas as opiniões contrárias, estejam à vontade para registrá-las em suas páginas.
Bom dia.

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